Comentário (Hubert Rohden):
Esta primeira palavra de Jesus referida por Tomé
logo revela o caráter místico do seu Evangelho. Os livros sacros usam a palavra
“morte”, tanto em sentido físico, como metafísico e aqui “morte” quer dizer a
permanência no plano do ego humano, ignorando o Eu-divino do homem, porquanto
nenhum homem se imortaliza pela mentalização do seu ego, mas tão somente pela
transmentalização rumo a seu Eu, ao seu Atman,
a sua Alma, que é o espírito de Deus em forma individual.
Já no livro do Gênese, a palavra “morte” é usada em
sentido metafísico, quando o Elohim,
as potências divinas, dizem a Adão: “Se
comeres do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal (do ego), logo
morrerás”. Adão comeu desse fruto e viveu ainda diversos séculos. O texto
não se refere à morte do corpo físico, mas sim à morte do ego-mental. O homem,
pelo despertamento do ego-consciência, permanece no plano da mortalidade.
Somente subindo ao plano superior da “árvore
da vida” é que ele entrará na imortalidade. O homem pode mortalizar-se e
pode, também, imortalizar-se. A serpente da Gênese simboliza o ego-mortal, o
poder que esmagará a cabeça da serpente representa o Eu imortal. Esse processo
evolutivo do ego-mortal para o Eu-imortal vai, através de todos os livros
sacros.
O próprio Cristo se identifica com o Eu-imortal
quando se compara à “serpente erguida às alturas”, que preserva da morte os que
haviam sido mordidos pelas serpentes rastejantes do ego humano.
Na filosofia oriental, aparece a palavra kundalini, cujo radical kundala significa serpente, símbolo da
energia cósmica. A kundalini dormente
no chakra inferior da coluna vertebral
representa o subconsciente do homem primitivo, quando ele desperta e rasteja
horizontalmente, entra na zona do ego-consciente e quando a kundalini se
verticaliza e atinge as alturas, então entra o homem no mundo do cosmo
consciente, onde ele se imortaliza.
O homem é potencialmente imortal ou imortalizável,
mas não é, atualmente, imortal, se assim fosse, não poderia sucumbir à morte
metafísica. A imortalização, ou imortalidade atual, é a conquista suprema da
consciência cosmo-crística do homem. Nesse sentido, afirma o Evangelho: “A tal ponto amou Deus o mundo que lhe
enviou seu filho unigênito, para que todos aqueles que com ele tenham
fidelidade não pereçam, mas tenham vida eterna”.
Também a história do filho pródigo usa a palavra “morto”
em sentido metafísico: “O pai daquele
jovem dia que seu folho estava morto e reviveu, estava no ego e passou para o
Eu”. E toda a subsequente alegria e felicidade só se compreende quando se
sabe que simboliza a apoteose de um ser humano que se auto realizou, passando
da ego-consciência mortal, para a Eu-consciência imortal.
Também no caso do discípulo que queria sepultar seu
pai, antes de atender ao convite de Jesus, o Mestre usa a palavra “morte” em
dois sentidos, físico e metafísico: deixa os (espiritualmente) mortos
sepultarem os seus (fisicamente) mortos.
O Credo Apostólico afirma que o Cristo julgará os
vivos e os mortos, isto é, os que vivem na cosmo-consciência e os que ainda
rastejam na ego-consciência.
Tomé refere as palavras do Cristo divino proferidas
através do veículo da personalidade humana de Jesus: “Quem descobrir o sentido destas
palavras não provará a morte”, quem compreender, pela intuição, o
sentido profundo das palavras deste Evangelho, esse não ficará no plano do ego
humano, mas se imortalizará pela consciência do Eu divino.
Compreender não é inteligir, entender, mas é saber
ou saborear com todas as potências do espírito. Essa sapiência ou saboreamento
espiritual, só acontece ao homem quando ele se abre rumo ao Infinito em
cosmo-meditação, em Cristo-conscientização. A verdadeira meditação é uma
invasão Cristo-cósmica na alma do homem. Enquanto o homem é ego pensante, nada
de grande lhe acontece, mas quando se torna cosmo-pensado, cosmo-agido,
cosmo-vivido, então lhe acontece a invasão cósmica do espírito de Deus, que
resolve todos os problemas da vida terrestre e introduz o homem na vida
verdadeira.
Nesta primeira palavra do seu Evangelho, Tomé já
antecipa uma verdadeira síntese de todas as verdades seguintes. E, à luz dessa
intuição mística, indigitou ele, o caráter fundamental da sua mensagem. A tal ponto
Tomé descreu no princípio, que, por fim, ultrapassou todo o descrer e também
todo o crer e atingiu as culminâncias de um saber e saborear Crístico.
Nenhum comentário:
Postar um comentário